by Pedro Romão
Wisteria Lane. A perfeição em cada esquina, a felicidade em cada rosto. A rua ziguezagueante apresenta-nos cada uma das famílias que compõem um típico bairro onde cada um vive o verdadeiro sonho americano. De repente, um soco no estômago. Mary Alice uma das mais bonitas e simpáticas residentes de Wisteria Lane suicida-se na sua sala de jantar enfiando uma bala na cabeça. O que terá acontecido? O que levará a que mulher com uma vida perfeita cometa um acto tão imbuído em desespero? Estão lançados os dados, e a vida em Wisteria Lane nunca mais será a mesma…

Esta poderia muito bem ser a sinopse desta brilhante soap opera. Um êxito fantástico em todo o mundo e um dos programas mais vistos nos Estados Unidos. Mas afinal o que tem esta série de singular? Poderia começar por referir que o segredo está na própria história, mas isso seria cliché e extremamente redutor. O que realmente distingue esta série das restantes é o aprofundamento dramático, as incoerências e as idiossincrasias das personagens. Aqui não há o bom, o mau e o vilão. Há pessoas. Pessoas que cometem injustiças, pessoas que falham, que erram, que mentem. Pessoas aparentemente perfeitas mas estranhamente bizarras. O factor-sucesso que eleva esta série a um patamar superior é o revelar dos problemas das pessoas comuns, o pôr a nu o interior por detrás da fachada, o demonstrar que existem segredos de uma vida que condicionam a forma de estar perante os outros e nós mesmos. Mas não caiam na ilusão. Desperate Housewives não é um drama. É assim um elegante e perfeito quadro onde as emoções são polvilhadas por umas nuances de comédia, algumas lágrimas e muito suspense.

Mas falar em Desperate Housewives sem falar nas mulheres que retraem e contêm todo esse desespero é difícil, dada a genialidade de cada uma das actrizes. Cada uma com sua especificidade, ou com uma característica distintiva de todas as outras (não seremos nós próprios assim?), a verdade é que este elenco é simplesmente fantástico pela sua homogeneidade e talento. No entanto, e que me perdoem Teri Hatcher e Eva Longoria (que, porém, começara agora a ganhar contornos que a torna das histórias mais interessantes de seguir), Felicity Huffman e Marcia Cross são realmente as duas actrizes que se destacam. De um talento enorme, de uma capacidade dramática arrebatadora e de uma veracidade que impressiona, Felicity Huffman é, sem grandes dúvidas, a personagem mais “real” da série. É impossível não nos revermos em determinados comportamentos, atitudes, e anseios da personagem que Felicity tão bem encarna e melhor ainda nos devolve. Depois, bem… depois temos esse monstro da representação que é Marcia Cross. Muito ajudada pela excelente personagem que tem, a verdade é que a actriz é realmente impressionante nos seus maneirismos, nos seus trejeitos e na naturalidade bizarra de Bree Van De Kamp. A sua compulsão-obssessiva é, a espaços, hilariante, e apesar de alguns excessos no percurso da personagem, a verdade é que é delicioso ver Cross em cena, arrebatando tudo e todos e deixando no ar o leve perfume de sedução.

E, no final, a voz quente e aveludada de Mary-Alice entra directamente na nossa consciência. São lições de vida que se tiram, consequências que nos fazem pensar e repensar os nossos actos e aquilo que julgamos ser verdade... É esta a grande virtude desta série, pôr-nos a pensar não só nas personagens mas também em nós, em como reagiríamos no meio de tanta pressão. No final, somos um deles, partilhamos os seus desgostos, as suas alegrias, o seu… desespero. No final, todos nós fazemos parte de Wisteria Lane.
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